O Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas (Niaid, na sigla em inglês), dos EUA, divulgou um documento no qual contraindica o uso de hidroxicloroquina e azitromicina para tratamento da Covid-19. A entidade também não indica o uso de lopinavir/ritonavir, drogas que também estão em estudo para tratar a doença.
A recomendação foi elaborada por um painel de especialistas com
representantes de pelos menos 13 entidades, como agências governamentais
(entre elas a agência que regula remédios, a FDA, e o Centro de
Controle de Doenças, o CDC) e associações médicas americanas.
Segundo o documento, o uso das drogas citadas só deve ser feita em ensaios clínicos.
A associação de hidroxicloroquina e azitromicina é desencorajada
por causa de sua potencial toxicidade. Com relação somente à
hidroxicloroquina e à cloroquina, o Niaid afirma que ainda não há dados
suficientes para uma indicação a favor ou contra as drogas no tratamento
da Covid-19. O documento alerta, contudo, que o uso deve ser
acompanhado de monitoramento dos efeitos adversos, considerando o risco
de alterações cardíacas e mal súbito.
O documento também afirma não haver evidências para indicação ou
desencorajamento do uso do remdesivir, também em estudo contra a doença.
As recomendações reproduzem a cautela de Anthony Fauci, diretor
do Niaid, quanto ao assunto e se contrapõem ao otimismo do presidente
republicano Donald Trump em relação à droga, situação que lembra os
diferentes tons do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta e do
presidente Jair Bolsonaro.
“É tudo baseado em dados”, disse Susan Swindells, membro do painel responsável pelas recomendações e professora na Universidade de Nebraska, à NPR. “Nós olhamos tudo que estava disponível. Não tinha nada funcionando maravilhosamente bem.”
s recomendações devem ser atualizadas conforme novos dados surgirem. Swindells também disse à NPR que existe a possibilidade de atualização quanto ao remdesivir já na próxima semana.
Estudo americano não mostra efeito de hidroxicloroquina e
azitromicina Um novo estudo americano ainda não publicado e revisado por
pares analisou uso de hidroxicloroquina e azitromicina em pacientes
internados de Covid-19 e não observou eficácia do tratamento em reduzir
mortes ou necessidade de respiração com auxílio de máquinas.
A pesquisa encontrou também uma mortalidade maior nos pacientes
que tomaram somente hidroxicloroquina. Problemas metodológicos, porém,
não permitem tirar conclusões seguras sobre uso da droga.
O estudo em questão é retrospectivo, ou seja, ele olha para o passado, o que já diminui o nível da evidência.
Os pesquisadores usaram informações do banco de dados americano
do sistema de saúde destinado a veteranos dos EUA referentes ao período
de 9 de março a 11 de abril.
Ao todo, foram incluídos na análise 368 pacientes, a maior parte
deles negros, todos homens e com uma média de idade acima de 65 anos.
Os próprios autores afirmam, na pesquisa, que esse recorte etário
e de gênero pode não ser visto em populações mais jovens ou de
mulheres.
Nos dados analisados pelos pesquisadores, 97 pacientes foram
medicados com hidroxicloroquina, 113 com a combinação de
hidroxicloroquina e azitromicina e 158 tiveram somente o tratamento
padrão para a doença (remédios sintomáticos). Os pacientes que receberam
as outras drogas também continuaram a receber, de modo associado, o
tratamento comum.
Comparado ao grupo que não tomou as medicações, os cientistas
encontraram um maior risco de morte no grupo que tomou somente
hidroxicloroquina. Nenhuma diferença foi encontrada em relação ao grupo
que tomou a combinação de hidroxicloroquina e azitromicina.
Especialistas afirmam que a maior mortalidade verificada pode ser
devida a diversos fatores. Nos pacientes que receberam as drogas, por
exemplo, a doença estava mais severa.
“Considerando-se que aproximadamente 80% dos pacientes com formas
leves e moderadas da doença vão se recuperar, provavelmente os
pacientes que não tomaram medicação teriam melhor evolução de qualquer
maneira”, diz Leonardo Weissmann, consultor da SBI (Sociedade Brasileira
de Infectologia).
Além disso, não há randomização dos pacientes, ou seja, a droga
não era distribuída aleatoriamente para os participantes do grupo, fator
que minimiza os riscos de vieses na pesquisa.
Com isso, segundo Weissmann, o estudo não traz novidades.
De toda forma, dizem os autores, “esses achados demonstram a
importância de esperar os resultados de estudos prospectivos,
randomizados e controlados já em andamento antes da adoção maciça do uso
dessas drogas”.
Algo na mesma linha de cautela consta em um documento recente da
SBI. “A Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) manifesta sua grande
preocupação pelo uso indiscriminado de medicamentos, vitaminas,
antioxidantes, entre outros, sem qualquer comprovação científica de
eficácia e segurança de seu uso.”
A sociedade afirma que os estudos não randomizados e não
controlados trarão, se muito, evidências científicas fracas de segurança
e eficácias de medicamentos, sejam eles quais forem.
“Corremos o risco de centenas de milhares de pacientes receberem medicações que, ao final, não saberemos se são eficazes e seguras contra a Covid-19”, afirma o documento, datado de 19 de abril, que aponta uma série de critérios para a condução adequada da pesquisa científica sobre a doença.
Da Folhapress