10 de novembro de 2025
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Rio São Francisco sofre o golpe mais severo com a crise hídrica do Bioma Cerrado

O Cerrado, conhecido como o “coração aquático do Brasil” por abrigar as nascentes de oito das doze grandes regiões hidrográficas do país, enfrenta uma crise hídrica alarmante. De acordo com uma análise inédita do projeto “Cerrado – O Elo Sagrado das Águas do Brasil”, da Ambiental Media, o bioma tem perdido o equivalente a 30 piscinas olímpicas de água por minuto. Essa sangria apresenta impactos particularmente severos na Bacia do Rio São Francisco.

O estudo, baseado em dados da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) e do MapBiomas, revela um cenário de declínio nas vazões dos rios, redução da pluviosidade e aumento da evapotranspiração potencial. A principal causa apontada é a expansão descontrolada do agronegócio exportador, aliada aos efeitos das mudanças climáticas.

A Bacia do Rio São Francisco emerge como a mais impactada entre as seis analisadas (Araguaia, Paraná, Parnaíba, São Francisco, Taquari e Tocantins). Os dados são contundentes:

Redução drástica da vazão mínima de segurança (Q90): O Velho Chico registrou uma queda de 50%, passando de 823 m³/s para 414 m³/s entre os períodos de 1970-1979 e 2012-2021.
Disparada da produção de soja: A área de cultivo de soja na bacia explodiu em 7.082% no mesmo período.
Perda de vegetação nativa: Houve uma diminuição de 20% da vegetação original.
Queda na pluviosidade e aumento da evapotranspiração: A pluviosidade na bacia do São Francisco caiu 28%, enquanto a evapotranspiração potencial aumentou 11%, indicando maior perda de água para a atmosfera.
Poluição alarmante: O Rio das Velhas, um dos afluentes mais importantes do São Francisco, apresentou 50,8% de amostras com excesso de poluentes entre 2019 e 2024. O próprio Rio São Francisco teve 38,1% de amostras fora dos limites.

IMPACTOS: A pesquisa evidencia que a perda de vegetação nativa diminui a capacidade de infiltração da água no solo, comprometendo a recarga de aquíferos e, consequentemente, a vazão dos rios em períodos de estiagem. O geógrafo Yuri Salmona, um dos autores do estudo, participou ainda de uma pesquisa em 2022 que previu uma perda de 34% do volume de água do Cerrado até 2050, sendo 56% atribuível ao desmatamento e mudança de uso do solo, e 44% às mudanças climáticas.

Embora o desmatamento no Cerrado tenha apresentado uma redução de 41% em 2024 em comparação com 2023, atingindo 652 mil hectares, o bioma ainda concentra 53% de toda a perda de vegetação nativa do Brasil no ano. A fronteira agrícola do Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) é a mais afetada, concentrando 82% de todo o desmatamento no Cerrado em 2024.

O mapeamento recente, “A Morte das Águas no Oeste da Bahia”, realizado pela Pastoral do Meio Ambiente e Comissão Pastoral da Terra, revelou um cenário desolador nas sub-bacias dos rios Corrente e Carinhanha, importantes afluentes do São Francisco. Foram identificados 3.050 trechos de águas secas, totalizando 7.120 km de extensão de “águas mortas”, além de outros 580 trechos em estado crítico. As comunidades testemunham que o secamento das águas teve início na década de 1980, coincidindo com a instalação dos primeiros projetos de plantio e desmatamento de grandes áreas.

O professor da Universidade Federal do Oeste da Bahia, Luís Gustavo, doutor em Recursos Hídricos, corrobora a gravidade da situação na região Oeste da Bahia, destacando a “redução gritante” das vazões dos rios desde a década de 80. Ele aponta a diminuição da capacidade de infiltração do solo devido à substituição do Cerrado por agricultura e a ampliação da área irrigada como fatores cruciais para a redução das vazões mínimas.

“Especialmente na região Oeste da Bahia, uma área que, através das bacias do Rio Grande e do Rio Corrente, tem um papel fundamental na contribuição para a vazão do São Francisco, percebemos uma dramática redução nas vazões dos rios. Nossos estudos e os trabalhos de conclusão de curso que orientei revelam uma redução gritante e facilmente perceptível na vazão, com uma intensificação notável a partir da década de 1990 e início dos anos 2000. Essa diminuição acentuada é uma preocupação constante e as causas são multifatoriais, reforçando a complexidade da questão”, afirmou o professor destacando que “ainda não há um consenso científico sobre a causa principal dessa redução, embora alguns pesquisadores apontem a diminuição da precipitação como fator preponderante, outros argumentam que apenas a chuva não justifica a magnitude do problema. Acredito que a solução para essa complexa questão não será encontrada em curto prazo, uma vez que se trata de uma interação de múltiplos fatores como desmatamento e seu impacto na recarga hídrica”.

Para o professor é crucial destacar a preocupação com o desmatamento. “Nossas pesquisas comprovam que a substituição do Cerrado pela agricultura reduz drasticamente a capacidade de infiltração dos solos. Isso, por sua vez, diminui a recarga do aquífero e, consequentemente, as vazões mínimas dos rios durante o período de seca. A expansão da irrigação, a ampliação das áreas irrigadas e a evapotranspiração são fatores, ainda, relevantes. Esse processo intensifica a evapotranspiração, devolvendo uma grande quantidade de água para a atmosfera que, de outra forma, escoaria pelos rios e chegaria ao São Francisco”, concluiu.

Diante do cenário, Marcus Vinicius Polignano, vice-presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, expressa profunda preocupação com os recentes cortes orçamentários destinados à Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) pelo Congresso Nacional. Os recursos, provenientes da cobrança pelo uso da água, são essenciais para financiar projetos ambientais, de saneamento e recuperação de áreas degradadas na bacia.

Polignano ressalta que o Comitê do São Francisco é uma das poucas entidades que efetivamente aplicam recursos da cobrança em obras demonstrativas, em contraste com a falta de concretização de promessas de revitalização por parte do governo federal. “A retirada desses recursos compromete gravemente a capacidade de gestão da bacia, deixando o ‘Velho Chico’ em uma situação de ‘navegação sem rumo’, especialmente diante das crescentes pressões das mudanças climáticas e da expansão agrícola. Apesar da urgência e da visibilidade dada à proposta de uma hidrovia no São Francisco, é preciso pensar na viabilidade de tal empreendimento sem a garantia de vazão e a revitalização do rio. A luta pela reversão dos cortes e pelo fortalecimento da gestão hídrica no Cerrado e, em especial, no Rio São Francisco, continua sendo uma prioridade para garantir a vida e o desenvolvimento sustentável da região e do país”, concluiu.

Juciana Cavalcante-Assessoria de Comunicação do CBHSF: Foto Ilustração Ipam

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